Por:
Débora Rossini
Se
você é um estudante universitário com deficiência – sobretudo
de universidade pública- este post é para você mesmo!!!!! Digo
“sobretudo de universidade pública” porque tais instituições
costumam dar bastante atenção não só ao ensino, mas também à
pesquisa e a projetos de extensão. Em tais instituições, tem -se
a “cultura” de preparar o aluno não só para o mercado, mas
também para a carreira acadêmica (mexer com pesquisa, fazer
mestrado e doutorado, etc.) Isto porque boa parte das atividades de
pesquisa, no Brasil, são realizadas em universidades públicas.
Neste
post, o conteúdo está mais focalizado para a deficiência VISUAL –
pois é ela que, a princípio, parece ser a que mais prejudica o
aluno na hora de estudar, devido à pouca acessibilidade a material
escolar e acompanhamento das aulas num sistema de ensino que prioriza
a visão. Mas se você é uma pessoa com deficiência de outras categorias (auditiva,
motora, etc), esteja à vontade para ler este post e verificar
possíveis identificações com ele! Afinal, o surdo tem dificuldade
de acompanhar palestras, aulas expositivas e conversas; o deficiente
físico tem limitações de acessibilidade arquitetônica... que, de
uma forma ou de outra, podem prejudicar o”andamento” das
atividades cotidianas... certinho? ;-)
Assim
sendo, você já deve ter ouvido de seus professores – e de colegas
mais experientes- a “formulinha de sucesso” para seguir carreira
acadêmica:
“Tire
boas notas, e mantenha um coeficiente de rendimento acadêmico alto –
pois, para concorrer a uma bolsa de iniciação científica, um dos
requisitos é ter notas muito boas. Em seguida, procure um professor
que tenha algum projeto de iniciação científica em andamento e
peça para ele te aceitar como orientado dele (ou se você quiser,
pode escrever seu próprio projeto de pesquisa e levar para um
professor te orientar nele.) Participe também de congressos (mesmo
que isso implique em ficar viajando constantemente), participe de
simpósios, não perca o que está “rolando” em sua área,
participe de programas de monitoria, e... bola pra frente, porque
isso tudo conta numa seleção de mestrado. Ah! E se você não fez
curso de inglês quando era adolescente, 'bóra' matricular num curso
para adultos, porque isso é requisito para se virar na carreira
acadêmica!”
A
uma hora dessas, você já deve estar pensando assim:
“AAAAAAAFFFFFFFF!!!!!
Então quer dizer que, por eu ser alguém com deficiência visual, não 'sirvo'
para a carreira acadêmica?
Mal tenho acesso a livros
didáticos e nem sempre tenho monitor para me ajudar, o que faz com
que eu passe nas matérias com notas 'raspando' na média; sou mais
lento para estudar, o que faz com que eu gaste o dobro (ou o triplo)
de tempo que os meus colegas, para fazer as mesmas atividades e
estudar para as mesmas provas... com isso, não tenho tempo para
ficar participando de atividades extras, pois o tempo mal dá para eu
me preparar para as atividades obrigatórias do curso e passar de
ano.
Além disso, como vou participar
de congressos e eventos extras, sendo que, tendo deficiência visual,
não dá para acompanhar apresentações em Power-Point e explicações
esquematizadas na lousa? Ao contrário dos professores com os quais
estou acostumado, o palestrante não vai saber como lidar com um
'ceguetinha' ali, na frente dele...!
Além do mais, não dá para eu
ficar viajando constantemente, pois isso toma-me dias que eu tenho de
faltar as aulas e depois tenho de ficar igual doido correndo atrás
de matéria atrasada, ainda mais que sou mais lento para estudar; já
não me bastam eventuais vezes que, por conta da minha limitação,
tenho de viajar para fazer tratamento médico, perder dias de aula e
ficar correndo atrás de matéria atrasada? Isso sem contar que a gente faz planos de viajar para um outro lugar, 'feliz da vida', e quando chega no local de destino, tem pouca ou nenhuma acessibilidade para pessoas com a minha limitação!!! Aí não dá para aproveitar plenamente o evento!!! ”
Tais
argumentações hipotéticas, que devem frequentemente passar pela
cabeça de estudantes com deficiência visual, devem também acometer, por exemplo, quem tem limitações relativas à audição (pela dificuldade de acompanhar conteúdos
expostos oralmente, pelas eventuais ausências às aulas por
tratamentos de saúde que acarretam acúmulos de matérias para
pessoas que já são lentas para estudar), e relativas à locomoção (como conseguir acomodação e acessibilidade em
lugares desconhecidos a serem frequentados? Tem banheiro, hotel
adaptado? Dependendo da causa da limitação física, têm menos
tempo livre para estudar e fazer outras atividades como as listadas
acima, por terem de frequentar exaustivas sessões de fisioterapia e
tratamentos médicos, além de eventualmente terem de viajar
para fazer consultas...) E aí?
Bom,
meu estimado leitor: se você faz parte da galera com os problemas
acima, relaxe! :-) Este post é um pouco longo, mas leia até o fim:
quem sabe ele pode te inspirar para algumas soluções?
Primeiramente, você tem de pôr na
cabeça que você não é IGUAL aos seus colegas , que têm o
“padrão” de “normalidade” (hã???!!!) que possibilita atender à risca
àquela “formulinha de sucesso” mostrada acima. Ou seja, você
precisa compreender que é “configurado fisicamente”
diferentemente deles... mas que, NEM POR ISSO, É MENOS CAPAZ”! ;-)
Sacou, meu amigo? Em outras palavras: você tem um ritmo e tempo
diferentes, e que, respeitando isso daí, você pode, SIM, seguir uma
carreira acadêmica de sucesso. Basta valer-se de algumas
estratégias!!!! Sendo assim, seu jeitão de se organizar para
“correr atrás” do sucesso pode até ser diferente dos seus
colegas... mas o resultado final PODE, SIM, SER O MESMO! E é isso
que importa!!! Manjou? A "formulinha" dada acima necessita apenas de algumas adaptações, no seu caso!!!
“Tá, mas como?” - você deve
estar pensando.
Simples: a solução consiste em adequar
as atividades acadêmicas às suas limitações e habilidades.
Veja só: vamos analisar a “formulinha de sucesso” passada
anteriormente, passo a passo?
“Tire boas notas, e mantenha um
coeficiente de rendimento acadêmico alto – pois, para concorrer a
uma bolsa de iniciação científica, um dos requisitos é ter notas
muito boas.”
Isso daí é o básico – e que,
certamente, já é uma “labuta” para você, né? Dica: em vez de
puxar um número alto de disciplinas por semestre, puxe menos! Se
estão marcadas, lá para o seu período letivo, umas 6 disciplinas,
não matricule-se nelas todas: escolha umas 4 ou 5, conforme o grau
de dificuldade que elas mostram. Procure equilibrar disciplinas com
maior grau de dificuldade com aquelas que sejam mais fáceis (peça
ajuda ao coordenador do seu curso para isso, se for o caso).
Lembre-se que para, pessoas como você, é preferível demorar um
semestre ou dois a mais para se formar, mas fazer as matérias bem
feitas, a ignorar o seu ritmo diferente dos seus colegas e...
puxar aquele tantão de matérias, mas ter dificuldade de dar conta
delas!!! Ah! Pela lei da Educação Inclusiva, estudantes
universitários com necessidades especiais TÊM DIREITO a um prazo de
integralização curricular maior!!! Não se preocupe!
Infelizmente, para poder ter direito a
bolsa de iniciação científica, as agências de fomento exigem
notas ALTAS, sim... independentemente de você ter dificuldade de
aprendizagem e só conseguir tirar notas menores, por maiores que
sejam seus esforços... :-( Então, o jeito é batalhar mesmo!
DICA ESPERTA: Tendo limitações
( sobretudo visuais ou auditivas) procure “garantir” notas mais altas logo no
INÍCIO do semestre... pois, no fim deste, além de você estar
sobrecarregado de atividades nas quais nem sempre dá para seu
professor lhe conceder prorrogação de tempo para entregar, os
monitores e colegas que porventura te ajudem certamente estão
atarefados também, desesperados para passar de ano!!! (Risos.)
Então, faça o inverso do que a maioria dos estudantes faz: garanta
nota ALTA no início, pois, se no final você der o azar de ter
poucos recursos de ajuda, não te prejudicará tanto. (Embora o CERTO seja o estudante com necessidades educacionais especiais ter garantia integral de ajuda do início ao fim do
semestre, eu tô trabalhando aqui com a hipótese REALISTA que
infelizmente, frequentemente ocorre).
“Em seguida, procure
um professor que tenha algum projeto de iniciação
científica em andamento e peça para ele te aceitar como orientado
dele. (ou se você quiser, pode escrever seu próprio projeto de
pesquisa e levar para um professor te orientar nele.)”
Conforme eu disse no parágrafo anterior,
se não tirar nota alta, não tem bolsa. Mas vá que , por motivo de
força maior, você não consiga desfilar por aí com coeficiente de
rendimento acadêmico maior que 80: se seus professores verem que
você é esforçado e que tem potencial, eles podem te dar uma chance
como colaborador de algum projeto que eles já tenham em andamento.
Você pode até não ganhar uma bolsa, mas ganha experiência, que
pode ser aproveitada posteriormente na hora de incluí-la em seu
currículo.
Vale também inscrever em programas de
Iniciação Científica Voluntária. Como o nome diz, você não
receberá bolsa... mas receberá certificado de participação, além
da experiência! Para essa modalidade de iniciação científica, as
exigências de notas são um pouco menores... e de horas semanais de
dedicação à atividade também! (Bom que sobra tempo para você
fazer outras coisas de que necessita, né?)
DICA ESPERTA: procure um tema que você
tenha conhecimento aprofundado e/ou interesse grande. Vão aumentar
as chances de se envolver intensamente com a atividade, fazer um
trabalho bem feito e ter sucesso!!!!
“Participe também de congressos
(mesmo que isso implique em ficar viajando constantemente pra lá e
para cá), participe de simpósios, não perca o que está “rolando”
em sua área, participe de programas de monitoria, e... bola pra
frente, porque isso tudo conta numa seleção de mestrado.”
Sim, isso é bom para sua formação, e
para turbinar seu currículo! Mas vá que você disponha de menos
tempo que seus colegas – 'ditos normais'- , pelo fato de gastar o
dobro de seu tempo para estudar (devido a dificuldades de
aprendizagem e de acesso a material didático adaptado), de ter de
dedicar horas da sua agenda semanal a tratamentos médicos e/ou de
reabilitação (“que você 'poderia' estar usando para estudar ou
fazer atividades de enriquecimento curricular”)... e vá que também
já necessite, eventualmente, de ter de ficar viajando para fazer
tratamento médico (o que implica em um tempo a mais “consumido”,
matérias a mais acumuladas para você, que já é lento para
estudar, ter de correr atrás)... ou, então, vá que os locais de destino não tenham acessibilidade adequada para te receber... aí fica realmente inviável para você,
estudante com deficiência, participar de eventos acadêmicos
extracurriculares no mesmo ritmo que seus colegas!!! (Quem é,
ou já foi deficiente/pessoa com necessidade educacional especial,
sente bem na pele o que é isso...!!!)
DICA
ESPERTA: Procure otimizar a sua escassa disponibilidade de tempo da
seguinte forma: durante o semestre letivo, dê preferência, ao
máximo, de participar de eventos dentro da sua própria
universidade ou então de outra que seja mais perto (há
inclusive cidades com mais de uma universidade pública – como São
Carlos/SP, por exemplo, que tem a USP e a UFSCAR no mesmo município!)
Isso evita gastos desnecessários de tempo para alguém que já tem
MAIS compromissos e escassez de tempo que uma pessoa sem deficiência!
“Ah, tá, mas é bom ver o que 'tá
rolando' em outras universidades, também em outras cidades... e eu
QUERO ver!!!” - você deve estar pensando.
DICA
ESPERTA: diversas universidades promovem “cursos de verão”,
cursos de inverno” que são eventos acadêmicos realizados em
períodos de férias. Assim sendo, aproveite! Dessa forma,
você poderá conhecer outras universidades, se assim desejar, sem
atrapalhar sua tão atribulada rotina! Aí dá para você entrar no
“busão” e viajar despreocupadamente!!!!!!
“Ah, mas tem um
amigo/conhecido/colega meu que tem lá as necessidades especiais dele, e nem por isso deixa de
pôr a mochilinha nas costas e viver viajando pra lá e pra cá
durante o semestre letivo, para participar de cursos...” - você
pode eventualmente deparar com uma situação dessas e ficar pensando
assim.
Meu querido leitor, antes de ficar
lamentando que você não é igual a esse indivíduo hipotético,
questione-se: Qual o curso que esta pessoa faz? É da mesma área que
o seu? Qual a carga horária de estudos (em sala de aula e
extraclasse) dele? Será que as especificidades dele, por ser alguém com deficiência e estudante, são iguais às suas?
Cada indivíduo é único... então leve
isso em conta! Nada de ficar comparando-se com os outros. Mesmo que a limitação do outro seja da mesma categoria que a sua, há inúmeras
particularidades entre uma pessoa e outra! Manjô? ;-)
“Ah! E se você não fez curso de
inglês quando era adolescente, 'bóra' matricular num curso para
adultos, porque isso é requisito para se virar na carreira
acadêmica!”
Ah, meu
filho, disso aí não tem jeito de fugir
não: VÁ fazer o curso de inglês – nem que seja o instrumental a
princípio- sem “mi-mi-mi”... Mas se você encontra
dificuldades por ser alguém com deficiência (de aprender a ortografia, por ter problemas sérios de visão; o som correto das palavras, por escutar pouco ou nada; dificuldades de locomoção para frequentar o curso, por falta de potência da visão ou do aparelho locomotor...), verifique a opção de fazer o
curso com professor particular (que atenderá melhor as suas
especificidades e necessidades de acordo com o seu objetivo).
Posteriormente, quando você estiver “mais seguro” , aí sim,
procure uma escola de inglês conceituada; aí, você poderá
“eliminar conteúdos” matriculando-se em um nível mais avançado,
e obter certificações de proficiência no idioma (úteis na hora de
comprovar formalmente conhecimento do idioma).
E então, leitor? Tá mais tranquilo?
Agora não tem desculpa não: se você QUER seguir carreira
acadêmica, vá sem medo!!!
Se você
ainda acha que isso é utopia, veja aqui alguns exemplos de pessoas
com deficiência/necessidades educacionais especiais, que possuem limitações
sim... mas que têm
inúmeras habilidades e talentos, também!!!! Clique
nos tópicos abaixo para ler um pouco mais sobre essas pessoas:
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